Contextualização
A Comunidade Alecrim é composta por cerca de oitenta famílias, fica no
meio rural do Município de Girau do Ponciano, região agreste de Alagoas e
possui duas escolas de ensino fundamental e outros ambientes comunitários,
utilizados pela população e pelos gestores públicos. Embora tenha uma equipe
técnica do Programa de Saúde da Família (PSF) não existe posto de saúde e a
equipe atende em uma casa alugada pela prefeitura municipal há pelo menos cinco
anos. Com relação à educação, cabe registrar que a prefeitura municipal mantém
salões particulares alugados para atender parte dos alunos da Educação Infantil,
do Ensino Fundamental e da Educação de Jovens e Adultos (EJA), já que as duas
escolas não comportam todos os alunos matriculados. Segundo relatos, apesar das
promessas políticas, essas salas improvisadas se mantêm há anos, sem as
condições apropriadas para o funcionamento. Entende-se que essa questão é séria
e precisa ser debatida, de forma ampla e em vários espaços políticos –
particularmente no âmbito da academia – pois é comum na região, apesar da
disponibilidade de recursos financeiros públicos para investir nas escolas
rurais e urbanas, no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
Na Comunidade Alecrim
não tem sistema de abastecimento de água e nem de saneamento. A Articulação no
Semiárido (ASA) está construindo cisternas para a coleta e o armazenamento de
água de chuva, já que as famílias não dispõem de fontes seguras de água e até
as escolas são abastecidas semanalmente pela prefeitura municipal, com água de
outras localidades, por meio de carros pipa que depositam a água em cisternas.
Há lixo depositado em vários lugares e o acesso é difícil por conta das
estradas que não são pavimentadas e pela precariedade dos serviços de
transporte públicos. As alunas utilizam suas próprias motos ou serviços de
motoqueiros para participarem das aulas e retornarem a tempo às suas casas, em
percursos longos e onerosos, que demandam tempo e esforço delas e das suas
respectivas famílias, diretamente envolvidas nessa caminhada para conclusão dos
estudos de nível superior.
2 – Apreensões e Percepções
A segunda aula
do Tempo Comunidade foi realizada no dia 31 de agosto de 2012, na Escola
Genoveva Maria, com a participação de professores/as dessa escola, convidados/as
para o debate acerca dos temas Agricultura e Sustentabilidade no Semiárido, a
partir da mostra comentada dos vídeos “Colher Água, Plantar Vida e “Água, Vida
e Alegria no Semiárido”, ambos produzidos pela ASA. Também esteve presente e
participando ativamente a professora Cristianlex Soares, que colaborou muito na
mediação dos debates, provocando e promovendo a aproximação entre as
experiências mostradas nos vídeos, das práticas educativas e das perspectivas
de transformação das realidades, a partir do ingresso destes/as no Procampo. O
que a Educação Contextualizada e o Procampo têm a ver com o Desenvolvimento
Local e a Convivência com o Semiárido? E quais as possíveis mudanças que os/as professores/as
podem provocar nos seus respectivos ambientes de trabalho e nas comunidades em
que vivem? Essas duas perguntas orientaram os debates acerca dos papeis e responsabilidades
de cada educador/a na gestão dos processos de melhoria dos ambientes e dos espaços
públicos, particularmente das escolas onde cada educador/a atua.
Partindo das provocações, vieram à tona
algumas questões presentes no cotidiano que permitem enxergarmos a necessidade
de aliarmos os conceitos com as práticas, melhorarmos nossas ações pedagógicas
e transcendermos nossos sentidos e sentimentos para assumirmos compromissos
mais ousados e condizentes com cada realidade e ampliarmos a visão acerca das
estratégias de desenvolvimento que já se materializam em outros municípios e em
outras comunidades e escolas da região, com seriedade e participação de todos
os segmentos sociais. Nessa direção, é possível apontar que as experiências
expostas nos dois vídeos e os depoimentos da professora Cristianlex acerca das
novas motivações e práticas da educação no Município de Igaci motivaram as
alunas do Procampo e os/as professores/as da Escola Genoveva a discutir acerca
das suas práticas e a perceber a necessidade de construção de novas relações
entre alunos/as, pais e mães, escolas, gestores públicos e as comunidades em
geral, na tomada de decisões coletivas para que as transformações possam se
materializar e sedimentar a educação como um dos caminhos para a autonomia das
pessoas e das suas organizações.
Vinculando as experiências e informações
mostradas nos dois vídeos e as possibilidades e necessidades de mudança nas
escolas, foram apontadas algumas estratégias, que partiram das observações
empíricas e da percepção da falta de algumas iniciativas simples que poderão
trazer resultados positivos para as escolas e para as comunidades. Especificamente
para a Escola Genoveva foram apontadas como possíveis ações: a) instalação de
bicas para coleta de água de chuva em toda a área coberta e armazenamento dessa
água na cisterna, para ser tratada e utilizada de forma diversa, conforme as
determinações internas, pois atualmente a escola é abastecida semanalmente por
meio de carro pipa, o que gera uma relação de dependência e subalternidade com a
prefeitura municipal; b) plantio de espécies frutíferas e medicinais no pátio,
que tem uma aparência estéril, pela falta de plantas, sombras, aves e vida; c)
reuso das águas da lavagem dos utensílios e do preparo dos alimentos na irrigação
das plantas; d) melhoria das instalações sanitárias, com a limpeza e manutenção
dos banheiros, pois é evidente a necessidade de mudança desses ambientes, de
suma importância para a saúde da comunidade escolar.
Essas estratégias foram apontadas como exeqüíveis,
porém não provocaram entusiasmo na turma que não demonstrou interesse em pensar
e planejar as intervenções naquela escola e nas outras do município e tais
observações remetem a outras que se complementam, sinalizando certa comodidade
por parte das alunas, que ressaltam com freqüência o fato de a prefeitura
garantir o abastecimento de água e os produtos para preparo da alimentação
escolar – embora tenha faltado merenda no primeiro semestre do corrente ano de
2012 que só foi regularizada depois de várias denúncias anônimas nas rádios e
no Ministério Público.
A aparente comodidade de algumas alunas
já havia se manifestado em outros momentos, quando se tratava da precariedade
das estradas de acesso, do abastecimento de água nas casas e nas escolas e das
próprias instalações das escolas daquela comunidade e vem carregada de outras
questões delicadas como a conivência com tais situações e a ‘defesa’ dos
gestores públicos, que mantém salas de aula em armazéns, salões e salas que não
comportam os/as alunos/as, bem como postos de saúde em locais impróprios. São
situações criadas em caráter provisório que se estendem durante anos, com
serviços parcos e precários, portanto, considerados normais e aceitáveis pela
população local que aparentemente não discute e debate com os gestores
públicos, as possíveis estratégias de melhoria. Como estamos tratando de
relações frágeis e politicamente arraigadas por conta dos contratos formais e
informais que mediatizam tais relações, parece prudente apontar alguns aspectos
visíveis nesse contexto:
§
São
completamente diferentes as opiniões daquelas alunas que participam de
movimentos sociais, assentadas de reforma agrária e que não tem vínculos com as
prefeituras, daquelas que são professoras, que tem salões alugados à prefeitura
e parentes trabalhando temporariamente na educação, na saúde e em outros
setores públicos, mesmo sem contratos.
§
As
alunas que participam de movimentos sociais e que não tem vínculos políticos e
empregatícios com a prefeitura são mais críticas, mais atentas a essas e outras
questões e tem mais práticas em reivindicar e debater em todas as instâncias
políticas. Essa mesclagem é importante porque amplia os discursos e chama a
atenção para os compromissos que os/as educadores/as deverão assumir perante a
sociedade, independente das relações com os gestores públicos.
§
Os
textos, os vídeos apresentados e os debates gerados nas dinâmicas do Procampo estão
influenciando determinadas mudanças de atos e de atitudes nos/as alunos/as,
pois os temas tratados e os trabalhos de avaliação solicitados e orientados
pelos/as professores/as são complementares e vêm reforçando a lógica da
construção de novos conhecimentos a partir de novas práticas pedagógicas. Tais
constatações vêm sendo reveladas a cada encontro com a turma e ficou mais
evidente nessa aula, quando foi abordado o trabalho solicitado pela professora
Cristianlex, de realização de Diagnósticos Rurais Participativos, por meio da
Metodologia DRP.
§
Os
Diagnósticos vão ser realizados nas comunidades dos/as alunos/as e segundo
depoimentos, os assuntos tratados se entrecruzam e se complementam, ampliando,
assim, a visão de quem está estudando e ensinando ao mesmo tempo, com acesso a um
novo leque de informações e de oportunidades de melhoria das práticas nas
escolas do campo.
§
Entende-se
por novas práticas pedagógicas, o uso de vídeos e textos apresentados e debatidos
em sala pelos/as alunos/as nas suas respectivas escolas e o interesse destes/as
por novas informações acerca de economia solidária, convivência com o semiárido,
agricultura familiar, crédito rural, reforma agrária, desenvolvimento local,
associativismo e a aplicação dos novos conhecimentos nas escolas, associações
comunitárias e em outros espaços políticos, por meio dos trabalhos cotidianos de
ensino, extensão e mobilização social desencadeados nas comunidades.
§
É
comum escutarmos nas aulas que alguns vídeos e textos estão inspirando as aulas
e os trabalhos de extensão e capacitação feitos pelos/as alunos/as em suas
respectivas instituições e essa constatação deixa a sensação de que nosso papel
está sendo cumprido, apesar de registrarmos a necessidade de mais encontros e
debates políticos entre a equipe de professores/as do Procampo.
§
Também
parece ser uma preocupação dessa equipe de professores/as a disposição de mais
tempo para socializarmos as experiências empíricas, discutirmos acerca dos
temas e das perspectivas de mudanças percebidas em sala e nas comunidades, bem
como as responsabilidades atribuídas ou que deveriam ser atribuídas à turma,
considerando que a maioria é de educadores/as e que estes/as precisam melhorar
suas práticas e participar mais ativamente dos espaços políticos locais para
que novas dinâmicas sejam construídas no âmbito da educação contextualizada, já
que estão inseridos/as num programa de educação do campo, que valoriza as
relações e dinâmicas do meio rural e suas interações com o meio urbano e a
sociedade de forma geral.
3 – Metodologia
A aula teve dois
momentos, que orientaram os debates para conclusão do ciclo de aulas da
Disciplina Agricultura I. No primeiro momento fez-se a rememoração dos
conceitos, princípios e experiências práticas dos assuntos tratados
anteriormente e a apresentação comentada do vídeo “Plantar Água, Colher Vida” e
no segundo momento o vídeo “Água, Vida e Alegria no Semiárido!” – composto por
oito filmes – provocou um debate interessante, a partir destas duas questões:
Quais os pontos relevantes de cada filme? Como poderemos discutir esses conteúdos
nas nossas aulas?
Para
comentar os filmes as pessoas foram escolhidas aleatoriamente entre os/as
professores/as da Escola Genoveva e as alunas do Procampo, mas a participação
foi bem mais ampla do que se esperava e todas as pessoas presentes acharam os
filmes interessantes pelos assuntos tratados e especialmente pela forma
abordada, com desenhos animados feitos por crianças; personagens, figuras,
questões e paisagens presentes no nosso cotidiano e pela linguagem direta e de
fácil assimilação pelas crianças e pelos jovens da educação básica.
Esses
os aspectos renderem um bom debate acerca dos instrumentos e dos recursos
didáticos e pedagógicos atuais – a exemplo dos vídeos disponíveis gratuitamente
na internet e em vários espaços públicos – e das possibilidades de ensinarmos
geografia, história, matemática, português, biologia e outras tantas
disciplinas, a partir de vídeos e de outras ferramentas que possam mobilizar
os/as alunos e provocar discussões e construir olhares mais críticos sobre a
sociedade, o ambiente, a política e outros fatores que condicionam a melhoria
dos processos educativos, de suma importância para o Desenvolvimento Local, a
Convivência com o Semiárido, a Agricultura Familiar e a Educação do Campo.
4
– Considerações Finais
O
tempo foi pouco para tanta discussão, tantas interpretações interessantes, mas
os vídeos foram disponibilizados para a Escola Genoveva Maria e os/as
participantes da aula foram orientados a vê-los com suas turmas e organizar
aulas externas para conhecer as experiências apresentadas, particularmente
aquelas desencadeadas por agricultores alagoanos que já vivenciam novas
perspectivas em suas vidas, com o processo de transição agroecológica, a gestão
racional da água, da terra e dos demais meios de produção e a inserção em redes
de mobilização social e o acúmulo de saberes que são apresentados e
disponibilizados para outros agricultores e pessoas de todos os segmentos que
se mostrarem interessadas.
De
modo especial, a experiência da família do Sr. Dedé com a gestão de uma
barragem subterrânea e a produção orgânica de hortaliças no meio rural do
Município de São José da Tapera chamou muito a atenção de todos/as e reforçou a
vontade de irmos conhecer essa família, já manifestada na visita técnica à
Feira Popular da Agricultura Familiar, realizada em Arapiraca, no último dia 25
de agosto, com a participação louvável do Sr. Sebastião Damasceno, agricultor
familiar em transição agroecológica do Município de Santana do Ipanema, que nos
deu uma aula prática a respeito da gestão familiar da produção agropecuária na
região semiárida, destacando a importância da Policultura, da Apicultura e dos
Bancos Comunitários de Sementes.
Com
base nas experiências mostradas nos vídeos e nos depoimentos é possível reafirmar
nosso interessem em conhecermos de perto as experiências dos dois agricultores
citados, para ampliarmos nossa visão acerca destes e das outras questões que
compreendem os vários contextos da Agricultura Familiar.
A
viagem para conhecermos essas experiências será tratada e organizada com a
turma durante as aulas da Disciplina Agricultura II e lançará pistas para novas
investigações empíricas e científicas nessa região.
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